VOGA

PROJETOS CONTEMPORÂNEOS COM IDENTIDADE FORMAL E CULTURA ARQUITETÔNICA

Concurso Complexo Casa da Feitoria Museu do Imigrante – 2º Lugar

Programa: Institucional

Localização: São Leopoldo, BR

Status: 2º Lugar

Ano: 2022

Equipe: VOGA

Memorial Descritivo

A restauração da antiga Casa da Feitoria associada a construções contemporâneas e a arquitetura da paisagem, reúnem atividades de lazer, cultura e economia criativa impactando positivamente no cotidiano da comunidade local e no turismo da região do Vale dos Sinos. A proposta do Estudo Preliminar levou em consideração os valores históricos e estéticos da Casa da Feitoria – que atenderá o Museu do Imigrante – e os potenciais de usos e apropriação no conjunto da área. Neste sentido a identidade formal representa a reconstrução da Casa da Feitoria/Museu do Imigrante associado a um eixo articulador que amarra e conecta a edificação anexa ao programa, assim como a escola existente e edificações voltadas a atividades festivas.

A conexão do patrimônio com os programas anexos ancorou a implantação da proposta, de modo a estruturar um eixo cultural que revela ao visitante diferentes perspectivas da paisagem e potencializa o local de memória, além de proporcionar sustentabilidade ao empreendimento. Por se tratar de um lote circundado por duas avenidas importantes, com a Av. Feitoria e o prolongamento da Av. Imperatriz Leopoldina, optou-se por estabelecer dois acessos de veículos – com embarque e desembarque – e um acesso principal na Av. Feitoria junto a escadaria original. No nível do acesso principal é onde inicia o desenvolvimento do eixo cultural e as articulações da Casa da Feitoria com os demais programas, tendo como ponto de partida o Plátano e a finalização na abundante vegetação do parque junto a uma área destinada a shows. A topografia adotada manteve a Casa da Feitoria no platô mais elevado em relação ao restante do projeto, atendendo a acessibilidade nos espaços internos e externos.

Olhar para esse lugar e revalorizar a cultura e história que essa edificação representa foi uma diretriz de projeto adotada na Casa da Feitoria – tombada pelo IPHAE em 1980 – e nos demais espaços que articulam-se entre si. Entre o patrimônio e a edificação da escola tem-se o volume do café, administração a apoio das exposições, configurando uma praça que resgata a memória dos diferentes povos que viveram no local. Para tanto, há uma esplanada elevada junto ao patrimônio que abrigou os primeiros alemães e espaços que homenageiam os índios Tupi-Guarani, os negros escravizados e imprime uma diversidade de usos através de ambientes para feiras e para contemplação. Os acessos e deslocamentos dos espaços abertos se desenvolvem por um desenho compositivo inspirado na planta da família da Cânaves – da produção de linho Cânhamo – dando um novo sentido ao conjunto como instrumento de transformação na cidade.

 

Reconstruir a parte da edificação que ruiu, retomando o momento de seu tombamento, proposto em 1937 e efetivado na década de 80, utilizando as mesmas técnicas e acabamentos externamente na casa, tem por objetivo retomar a memória da edificação, sobretudo no que se refere aos processos migratórios que ocorreram no Rio Grande do Sul e deixaram marcas na arquitetura da Casa da Feitoria. Ressalta-se que a casa possui inúmeras representações na memória, de diferentes grupos sociais, estando relacionada a consolidação da arquitetura luso-brasileira, aos imigrantes alemães, como também rememorada como sendo um “espaço de trabalho de feitores e de pessoas escravizadas” (MEIRA, 2020). A fim de revelar a contemporaneidade da intervenção, e, alinhado às premissas e diretrizes sobre restauro e patrimônio, especialmente o disposto na Carta de Veneza, busca-se, internamente na casa, tornar visível e clara a diferença entre o novo e o antigo, por meio da materialidade e elementos que constituem a proposta.

A distribuição do programa do Museu – na Casa da Feitoria – está estruturado com uma entrada controlada junto a conexão do eixo estruturante e uma saída na área que desabou abrindo para a esplanada e a praça central. O percurso do museu inicia por uma sala de vídeo que introduz ao visitante a história e fatos importantes do local, seguindo por uma sala de objeto – do Museu Histórico Visconde de São Leopoldo, passando pela sala de exposição permanente e finalizando na sala de exposição temporária. Internamente a proposta conta com suportes expositivos em vidro e mobiliários de apoio contemporâneos e neutros para minimizar seu impacto visual na edificação. Como estratégia projetual utilizou-se madeira na pavimentação associada a um piso em pedra basalto na orientação do circuito em harmonia e equilíbrio com a parte remanescente. O acesso na parte que colapsou acontece através de um “túnel da memória” um elemento que destaca o novo e o antigo levando o usuário a sala de exposição temporária com o piso em pedra basalto no percurso e o vidro como uma pavimentação transparente que releva as caliças e pedras do desabamento. Aqui os expositores se revelam em vidro como na anterior apoiados sobre cavaletes em pedra, com acentos em mesmo material como apoio. Quanto a climatização artificial propõem-se sistema VRF (Fluxo de Gás Refrigerante Variável) com estações condensadoras sob grelhas externas e dutos de distribuição aparentes junto as treliças em madeira e; para atender a eficiência energética é acrescentado forro em madeira junto as telhas e trilhos de iluminação para as exposições com sistema flexível conforme curadoria.

Busca-se reintegrar a paisagem cultural da cidade, mantendo os traços que definem a edificação no espaço e tempo dos processos migratórios que se passaram no RS. Já internamente os conceitos e estratégias buscam revelar as intervenções contemporâneas. A renovação do cartão postal da Casa da Feitoria teve como base o conceito de reconstrução como manutenção da memória, considerando a teoria de restauro de Cesare Brandi, no que diz respeito a consideração dos aspectos estéticos e históricos, sobretudo com base nos documentos que comprovam o estado do bem ao longo do tempo, a fim de reconstruí-lo como um espaço icônicos e parte integrante da paisagem cultural da cidade de São Leopoldo.

A edificação de apoio compreende o programa de um café – voltado a praça central, estrutura administrativa e apoio do museu com área de acervo e restauro. Esses ambientes estão próximos a recepção/bilheteria, sanitários e a conexão com o Museu do Imigrante, atendendo as questões de habitabilidade. A exposição itinerante acontece no eixo estruturante – no patamar desse volume – com possibilidade de fechamentos por painéis móveis.


Na escola existente – CEEPRO – foi projetado uma máscara na fachada que possibilita um percurso coberto até o eixo estruturante e neutraliza a fachada para praça central. Nesse edifício os sanitários do térreo foram adaptados para os funcionários do complexo e o programa pode ser voltado a gastronomia, a oficinas criativas de inovação conforme demandas da comunidade. Seguindo o alinhamento da escola propõem-se um conjunto maior de sanitários para o público com acesso pelo eixo estruturante.


O tratamento paisagístico considerou no “L” da escola que abraça o pátio algumas mesas e bancos para reunião de pessoas, grupos escolares e local para refeições ao ar livre. Em frente a esta área um gramado com árvores frutíferas, seguido por espaços infantis. Nesse mesmo setor espaços com perspectivas históricas são registradas nos painéis de fechamento do eixo, que seguem o ritmo e a modulação da Casa da Feitoria, com elementos opacos na testada sul e permeáveis na testada norte.


A proposta dos espaços abertos levou em consideração a parte aberta do arroio com a atual vegetação e mobiliários móveis com redes de descanso e nos demais trecho canalizados como se apresenta atualmente. A pavimentação proposta nos percurso externos é a madeira plástica e o concreto intertravado que resiste a cargas como os food truck e auxilia na permeabilidade do solo. Os mobiliários – como lixeiras, paraciclo, luminárias e bancos – foram estrategicamente posicionados para atender o público de forma a contemplar a arquitetura da paisagem.

Os volumes festivos estão posicionados em área plana e com pouca vegetação por se tratar de um campo verde. A edificação intitulada salão multiuso permite diversas atividades, como festas, eventos empresariais e culturais. Trata-se um salão plano – que permite diferentes arranjos de layout – com um palco e uma cozinha industrial de apoio – semelhante ao Instituto Ling de Porto Alegre – com sanitários defronte ao acesso do salão. Este salão gera uma sustentabilidade financeira com a possibilidade de locação para empresas, instituições entre outros interessados pela flexibilidade de utilização e por ter acesso independente. 

A edificação para show pode atender a São Leopoldo FEST – festa tradicional na cidade – e eventos culturais. Para tanto foi proposto camarim e área de apoio para equipamentos. O backstage do palco enquadra a vegetação abundante da gleba, e também pode ser fechado conforme demandas acústicas. A área do gramado é pensado como a plateia para os shows e, também pode ser utilizado para contemplação e atividades esportivas diversas, com pistas móveis.

Segundo a Carta de Veneza, a restauração é uma ação de caráter excepcional, devido a falta de conservação da edificação ou monumento. Ela deve tomar como base o preexistente e a autenticidade, em respeito ao material original e documentos autênticos, visando recuperar a integridade da obra. A presente proposta envolve o princípio do restauro aliado à adequação para os novos usos propostos na Casa da Feitoria e conjunto. A ideia da implantação é que o restauro e as proposições do complexo possam promover o resgate dos valores históricos e estéticos do lugar e seu entorno, recuperando o valor cultural para toda a comunidade.

Equipe

Gerente de Projeto: Luciane Kinsel
Líder de Projeto: Matheus Fernandes
Arquitetura: Alana Stankiewicz, Luciane Kinsel, Matheus Fernandes, Odilon Gheller, Rodolfo Bohrer, Renata Ribeiro, Tayná Frohlich

Faça o download das pranchas do projeto aqui.

Colaboradores

Consultoria: Jamile Weizenmann